8 de abr. de 2011

Entre a dor e o egoismo



Ainda não acordei do pesadelo. É como se eu ainda tivesse meus filhos pequenos, no colégio, e precisasse agir, imediatamente, pra proteger os dois. Cheguei a sonhar que um monstro saía do meio do chão, primeiro insignificamente pequeno, depois imenso, e que ia engolindo famílias, enquanto em caminhava com meu filho pela rua. Dá náusea ver e ouvir os choros das mães, dos familiares, dos amigos e das crianças que testemunharam a chacina, vontade de desligar televisão, não entrar nos sites de notícias, esquecer. Mas não tem como desligar este botão interno que liga cada um ao fato e às vítimas.
Vi uma profissional experiente e sempre serena,  Sandra Annemberg, se perder, literalmente, diante das câmeras, no Jornal Hoje, logo depois da exibição do vídeo sobre o enterro de uma das meninas assassinadas e da chuva de pétalas de rosa promovida por um helicóptero da polícia. Tenho visto profissionais de psicologia e de psiquiatria de diferentes correntes, psicólogos, educadores, jornalistas, todos perplexos repetindo e repetindo a carta do assassino,  explicações médicas, palpites, dúvidas. Nada explica, nada consola.
O corpo de Wellington Menezes de Oliveira, que calmamente foi executando crianças e adolescentes, até o momento em que escrevo estas linhas, não foi procurado por nem um parente, ou amigo, ou quem sabe, alguém com piedade suficiente para enterrar  um bandido imperdoável. E eu, e o país inteiro, aqui, sem nem saber direito o que escrever, tentando fazer meus trabalhos, tocar a vida, agradecer pela chance de nunca ter vivido um horror desses ao vivo.
Assisto a meus colegas, de diferentes veículos de comunicação, tentando cumprir sua obrigação profissional, alguns mais sóbrios, outros menos, mas todos, sem exceção, assinalando no que falam, no que escrevem, no que exibem na telinha, que estão, também, tristes, assustados e ainda incrédulos. E até aquele repórter que pergunta ao pai, que fala sobre o medo do filho, que estuda em escola particular, longe da cena do crime se este pai chorou, em vez de me irritar, como habitualmente acontece, ganha minha solidariedade porque ele também, que segura o microfone, com certeza quer também saber se todos se sensibilizaram e sofrem como se deve sofrer nessa hora.
Grades, mais guardas, proibir venda de armas com mais rigor, controlar a venda de armas com efetividade, evitar que se trafiquem armas, mais câmeras de segurança, funcionários mais atentos, treinamento de alunos diante de situações como essa, mais assistentes sociais com maior suporte do pai-Estado para tratar das feridas nas comunidades carentes, mais psicólogos para atentar aos sinais de um aluno problema e dos que cometem bullying, a lista é longa de ações para que isso nunca mais aconteça. Por enquanto, porém, é luto, é tristeza. Não consigo achar solução para nada. Só, egoisticamente, celebrar a vida dos meus filhos e dos filhos de meus afetos.

9 comentários:

Roney Maurício disse...

Ei Maristela,
sentindo falta das suas postagens aqui... Mas confesso dificuldade para comentar este, tão bem escrito (como de costume).

Pesadelo de todos que tem filhos ou os terão um dia, impossível exprimir a dor das vítimas que, claro, não foram só os adolescentes brutalmente assassinados...

Não creio que se possa estabelecer uma "agenda positiva" a partir do terror e do assombro desse caso. Coisa de um maluco filho da puta, perdoe a expressão, não creio que possa ser racionalizada e gerar medidas preventivas. Só horror e desolação!

Mas sempre há os que tentam, tão filhos da puta quanto, capitalizar politicamente com o desastroso episódio. E já há um debate estabelecido entre defensores do desarmamento e seus opositores, seguindo o quadro partidário-ideológico vigente. A estes, de ambos os lados, só consigo dispensar desprezo...

Finalmente, apesar de considerar inevitável a tragédia não creio que sejam todos vítimas do monstro demente. Por exemplo: é razoável que as escolas municipais cariocas não tenham sequer porteiros, para não falar em seguranças? Alguém da nossa prestigiosa classe média põe seus filhos para estudar em escola privada que não tenham porteiros e seguranças?

Helô Müller disse...

Oi Maristela!
Já tinha passado por aqui, mas fiquei sem ter o que dizer, naquele momento!
Voltei, e continuo sem saber como me expressar...
Parabenizo a vc por ter externado a sua dor, e ainda nos dar o privilégio de dividi-la conosco!
Não sei se já seria o momento certo de aquilatarmos o que se tirar desta tragédia... tanto no presente, como até mesmo, em possíveis medidas preventivas...
O momento ainda é de luto e horror! A solidariedade e consternação de todos, se manifesta na repetição incansável da tragédia, alimentada tanto pela mídia, quanto por todos nós cidadãos, talvez como forma de tentarmos digerir, tamanha estupidez e brutalidade!
No momento, nada mais a acrescentar...
Bj
Helô

Helô Müller disse...

errata:
desconsiderem a vírgula, na última frase, após "digerir" ...
Please!! rs
+ bjs

Ulisses Reis ® disse...

Difícil aceitar tudo isso, acreditar que ainda haverá mudanças para melhor, que uma Copa do Mundo e uma Olimpíadas, vão ajudar, não acredito sei que vão roubar dinheiro e a Nação fica de lado, que daqui um mês, o que será de tudo isso?

ONG ALERTA disse...

Pena que nosso país seja só roubalheira, beijo Lisette.

Vilmar Barros de Oliveira disse...

Oi Maristela,
Entro no seu blog e me deparo com este post, um soco no estômago.
Cada vez que me lembro desse episódio, a sensação de completa paralisação de sentidos, não há o que dizer, o que comentar. Eu não consigo.
Mas vc o fez bem, de forma coerente e clara.
Beijo grande.

Fernando Santos (Chana) disse...

Excelente post....
Cumprimentos

Sylvio de Alencar. disse...

Nunca tinha lido um post seu.
Suas palavras calam...
Uma tristeza este fato.

Abraços.

Francisco Coimbra disse...

É comum a sensação de ser difícil comentar o que não tem digestão possível, vale pedir um novo post? Beijo