4 de fev. de 2011

Direto do quarto do hotel. Ou jornalismo-fraude (By Maristela)

Escrevo enquanto ouço na Globonews o mesmo "correspondente" que contou que estava trancado no hotel por medo (e fez a "cobertura" jornalística da muvuca no Egito de seu quarto) dizer que tudo melhorou porque os governistas saíram da rua. Com este gesto de bondade dos governistas que foram malvados com os jornalistas, nosso nobre colega também comentou que "parece" que a Al Jazhera havia sido atacada. Ou seja: jornalismo zero, o pior do mundo, aquele do achismo. Pior é que as pessoas perderam a vergonha de mostrar abertamente que são uma fraude!
Como é que um jornalista pega o passaporte, aceita e muitas vezes faz o maior lobby para ir para aquilo que se chamava antigamente de "zona de confronto" a fim de exercer seu papel fundamental de obter e divulgar informações que esclareçam leitores, espectadores e ouvintes, como é que estas criaturas resolvem inverter o polo e se botar no centro de tudo, como umbigo do jornalismo?
Tive, faz pouco, um bate boca com um amigo no Facebook porque critiquei esta amoralidade usual no jornalismo de hoje e principalmente o mimimi dos que deveriam ser profissionais por terem sido detidos ou impedidos de exercer seu trabalho. Não é questão de apoiar agressões e exigir que jornalista seja mais que um ser humano: me irrita e me dá coceira o quanto estes que deveriam ser discretos em sua função se botarem no pedestal e faturar com a vitimização.
Hamilton Ribeiro perdeu uma perna ao cobrir a guerra do Vietname. Foi, claro, personagem de matéria da revista Realidade. Mas sempre se mostrou cioso de seu papel diante do acontecido – foi uma vítima a mais no cumprimento do dever, como soldados, médicos, enfermeiros ou até o entregador de pão que pode ter morrido ao ser atingido por um tiro ou um estilhaço de granada.
Assim como me incomodou muito a carnavalização do terremoto no Haiti, feita especialmente via twitter, com endeusamento dos repórteres que para lá seguiram e passaram a choramingar aquela ladainha "nunca vi coisa assim" ou, mesmo com pouco mais de 20 anos, "em toda minha vida nunca pensei assistir tal horror"! Falta pudor a quem vai para um trabalho num lugar de confusão, com óbvia previsão de mortos e feridos, sem um mínimo de preparo até emocional para o que vai enfrentar. Matérias "humanas" estão a tal ponto banalizadas, mas formuladas e mal escritas que quem tem um mínimo de senso crítico deixa a leitura no primeiro parágrafo.
A qualidade do trabalho jornalístico não caiu: desabou! Bons tempos aqueles em que o velho e nascente Correio do Povo ocupava toda a primeira página com textos cujo nariz de cera era uma viagem de ficcionista amador: era, pelo menos, autêntica, um jornalismo fruto de uma época ainda gongórica, de passagem de século 19 para o 20, quando se morria de tuberculose por "amor". Hoje, é falta de decoro mesmo. É puro marketing pessoal do mais chinelo.
Confio muito mais no que leio nas redes sociais do que no blablabla dos "enviados especiais". Mais que ficar com vergonha alheia pelas cagadas que leio, ouço e vejo, fico com pena de quem é manipulado por veículos e seus empregados que, logo, estarão assinando livrecos para narrar "o outro lado" daquela reportagem dificílima que quase lhes custou a vida.

4 comentários:

Roney Maurício disse...

Ei Maristela,
o assunto é especializado demais pra que eu me aventure a opinar; quem sabe algum dos nossos muitos leitores jornalistas...

Mas é fato que uma certa "glamourização" da profissão tem contribuído para reduzir a credibilidade do que realmente importa, a informação. Me espanta também a quase vulgarização das entrevistas a jornalistas, até nos telejornais. Devia ser o contrário, não?

APPedrosa disse...

Não dá para generalizar, mas eu detesto quando o jornalista vira a notícia. Nós só estamos em algum lugar para contar o que acontece, dar voz a quem não tem, e não para falar "eu senti isso", "eu fiz aquilo".

Carla Farinazzi disse...

Oi Maristela!

Gostei muito de sua escrita, você tem profundidade imensa. Fiquei emocionada com o post sobre a Adriana Guedes. Muito bonito o que você escreveu.
Que bacana.

Concordo com a Ana Paula, o jornalista não deve ser a notícia, né? E sim ser a ligação entre a notícia e o público (penso eu, como público).

Um beijo

Carla

2edoissao5 disse...

o pior é que depois do carnaval é o esquecimento completo do assunto.